Já se foi o tempo em que pai era apenas o responsável por prover a casa e ser mais rígido com os filhos caso houvesse “necessidade”, de acordo os padrões de criação da época. A figura do “pai patrão” foi vencida pelo tempo, ao passo que a sociedade ganhou consciência sobre o papel de todos na educação de crianças e adolescentes e a importância da divisão das responsabilidades parentais.
A partir dos anos 1960, o “pai patrão” recebeu uma camada de heroísmo. Para aproximar a figura paterna dos filhos, que costumavam crescer sem grandes relações afetivas com “o homem que pagava as contas”, acrescentou-se ao pai a ideia de defesa da família, associada geralmente a uma força física ou profissional, apresentando-o como capaz de resolver “qualquer parada”. Era o tempo do “pai herói”. Sem capa, mas coberto de heroísmo.
Essa imagem persistiu até os anos 1980, quando um novo pai passou a ser encontrado com mais frequência: o “pai ajudante”. Numa configuração doméstica na qual ambos trabalhavam fora de casa, as contas passaram a ser rateadas e o tempo “livre” das mães já não era mais tão livre assim. Esse pai passou a ser cada vez mais recorrente, com disposição para “ajudar” a mãe. Teve como sua representação máxima o mote do comercial da marca Gelol de 1982: “Não basta ser pai, tem que participar”.
A década de 2010, por sua vez, foi decisiva para mais uma atualização da persona paterna. O avançar do século XXI e os novos entendimentos sobre temas como relacionamento, família e criação permitiram a lapidação do “pai moderno”, que entende ter as mesmas responsabilidades das mães na hora de cuidar e educar seus filhos. Não se trata de “ajudar”, mas de fazer o seu, como algo próprio da paternidade.
Quem conta um pouco sobre essa evolução da figura do pai dentro do contexto familiar é a psicóloga Taciana Chiquetti. Para ela, o amadurecimento da sociedade sobre o tema e a evolução das próprias relações interpessoais permitiram uma aproximação dos pais dos papéis que devem exercer de fato, sem distâncias e concentração de responsabilidades nas mães. A mudança, na visão da especialista, é benéfica para todos.
“A atualização da divisão de atribuições, considerando que pai e mãe são responsáveis na mesma proporção, fortalece a família, o casal e os laços com os filhos, sem setorização ou cobranças indevidas. Os dois são importantes na mesma proporção. O tempo disponível de cada um deve ser respeitado, a mãe inclusive pode estar menos disponível que o pai, mas o importante é que, no equilíbrio, os dois se vejam como corresponsáveis”, explica ela.
O advogado Ricardo Maia, de 38 anos, é um desses “pais modernos” que prefere ser definido apenas como “pai, pai”. Ou seja: aquele que faz o que deve ser feito sem considerar essas ações heroicas ou vanguardistas. Ricardo tem duas filhas: Amelie, de cinco anos, e Elis, de um ano. Trocar fraldas, dar banho, colocar para dormir, vestir roupas, alimentar… Não importa a atividade, tudo é dividido entre ele e a esposa, a também advogada Ana Clara, de 34 anos.
“Tudo aconteceu de modo natural”, conta ele, que lembra que não foi preciso combinar nada com a esposa. “Quando Amelie nasceu, eu já sabia que não haveria setorização. Na verdade, eu nem via como um dever simplesmente, eu queria participar mesmo, fazer tudo”, afirma.
O desejo de Ricardo, como ele detalha, não era cumprir tabela e sim estabelecer com a filha um vínculo afetivo forte e seguro, com vantagens para os dois:
“Exercer a paternidade me fazia feliz”.
Elis veio ao mundo quatro anos depois e a dinâmica se repetiu, o que exigiu apenas uma nova formatação, já que agora eram duas crianças ao invés de uma.
“Mesmo sendo dois adultos para duas crianças, uma matemática aparentemente simples, tivemos que nos ajustar. Para não cometermos o erro de ficar um focado em uma filha e o outro, na segunda. Acho que conseguimos administrar bem, participando os dois dos afazeres das duas”, compartilha ele.
Para Taciana, esse é o caminho: pais mais presentes por vontade própria, sem haver cobranças por parte das mães.
“Essa é a verdadeira paternidade, que passa pela compreensão do papel de pai em sua completude, com seus ônus e bônus, e de querer exercê-lo de modo genuíno”, resume.
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