Hoje, no dia 2 de novembro, católicos do mundo inteiro relembram a memória dos seus entes queridos que se foram, rezando-se pelas suas almas. Assim nos ensina o catecismo:
“Reconhecendo cabalmente esta comunhão de todo o corpo místico de Jesus Cristo, a Igreja terrestre, desde os tempos primevos da religião cristã, venerou com grande piedade a memória dos defuntos” (Catecismo da Igreja Católica 958).
Este Dia de Finados em especial, o primeiro depois dos desafios que enfrentamos em 2020, ano marcado por altas restrições sanitárias pela pandemia de coronavírus, parece diferente. Além do peso das inúmeras perdas que vivemos há tão pouco tempo para a Covid-19, que aumentou muito o número de pessoas vivendo o luto, esse ano os cemitérios e igrejas estarão abertos durante o dia de hoje, e poderemos rezar juntos pelos entes e pessoas queridas que perdemos.
A psicóloga e pesquisadora Milena Câmara, de Natal/RN, contou para a Agência Brasil sobre como as características das perdas durante a pandemia de covid-19 foram mais difíceis por terem ocorrido em um cenário de solidão e com apoio social limitado:
“Às vezes, não há como receber aquele abraço em que as palavras são desnecessárias. Por isso, nesse caso, há vários fatos complicadores de luto e podem gerar processo mais prolongado”.
O luto não é um sentimento vivido de uma única maneira. Em sua obra intitulada “Sobre a morte e o morrer”, a psiquiatra Elisabeth Kübler-Ross falou sobre como o luto é um processo que costuma seguir cinco fases com reações diferentes, que podem inclusive ocorrer de uma única vez, sem que cada uma delas tenha um tempo preciso de duração.
Em qualquer etapa do luto, não podemos esquecer que na fé está a maior força para enfrentar o sofrimento pela perda de um ente querido. É muito importante se apoiar na força do amor construído entre aquele que ficou e aquele que se foi, além da fé de que a vida não é tirada, mas transformada, para superar a dor da perda. É preciso valorizar a vida e enxergar a morte como uma oportunidade de encontrar a eternidade com Deus.
Nós te contamos no início deste ano como a fé ajuda a viver o luto. E trouxemos as palavras da jornalista e escritora Camila Goytacaz, que realiza palestras e busca ajudar mães que, como ela, perderam seus filhos:
“A mensagem que quero deixar é: você vai ser feliz de novo, sem ele, e por ele. Eu sou feliz. Talvez eu seja até mais feliz, porque hoje eu sou mais conectada com a vida. Eu me sinto mais forte, mais corajosa. Sou uma mãe mais potente, estou mais acordada para vida. Celebro a vida e a esperança”.
É muito comum que a pessoa enlutada passe um tempo em negação de que a pessoa realmente se foi; algo nela não acredita, acha que pode haver enganos. É uma fase que pode durar minutos ou anos. A escritora Joan Didion, por exemplo, em seu livro O ano do pensamento mágico, conta que foi esse o tempo em que tinha o “pensamento mágico” de que seu marido não tinha realmente morrido, e que entraria pela porta repentinamente. “Esperamos ficar prostrados, inconsoláveis, loucos com a perda, mas não imaginamos que vamos ficar completamente loucos, acreditando que o marido vai voltar precisando de seus sapatos”, escreve.
Esta fase é a mais delicada, pois a pessoa pode ter atitudes desagradáveis. Sentir raiva não é bom para quem sente nem para quem está por perto. A raiva é uma manifestação da dor que a pessoa está sentindo. É o momento em que a pessoa volta a se conectar com seus arredores, mas ainda não consegue fazer isso de uma forma positiva, podendo sentir raiva dos parentes, do fato que causou a perda, de alguém que acreditava poder ter evitado a morte. Toda a frustração que a pessoa sente é direcionada ao outro ou até para Deus.
Neste momento, é muito importante ter fé e manter a confiança em Nosso Senhor. Quando falamos sobre O luto de filhas que perderam os pais, a psicóloga Paula Leverone nos contou como “é normal que por um momento a pessoa enlutada ‘brigue com Deus’, sinta raiva ou até se afaste para depois se reconciliar. Por outro lado, também vemos pessoas que não tinham uma religião e passam a buscar esse apoio, significados e conforto na espiritualidade. A relação com a fé também oscila durante o luto, mas de forma geral é de grande ajuda no enfrentamento do processo”.
Como a revolta não traz nenhum alívio, nesta fase a pessoa começa a formular modos de reverter o que está vivendo. Se o luto que se está vivendo é um luto antecipado (a pessoa ainda não se foi, mas não há mais como evitar o resultado), é o momento em que o enlutado pensa em buscar todos os meios possíveis, como tratamentos alternativos. Quando a pessoa amada já se foi, o enlutado pensa sobre o que poderia ter feito de outra forma para evitar estar, neste momento, vivendo o vazio da perda. É uma fase em que é muito importante entender que a perda não foi culpa sua.
Essa fase é a mais difícil, mas é também uma etapa muito importante e que deve ser respeitada. É o estágio mais intenso e que costuma ser mais demorado e presente.
O respeito, neste momento, é muito importante: lembre-se que te contamos o que NÃO dizer para alguém que está passando pelo luto. A dor e a tristeza aqui não se confundem com a depressão como distúrbio mental: ela faz parte do processo de luto em todos nós. Todavia, mesmo nesse caso, é importante que a pessoa enlutada busque ajuda para passar por todo o processo, principalmente se tiver predisposição à depressão.
Não diminua a dor de quem passa pelo luto, não diga que “já está na hora de superar”, ou compare o processo dela com o de outras pessoas. Cada um vivencia o luto de um jeito. Respeite o tempo da pessoa e ajude ela a encontrar apoio com profissionais habilitados especialistas em luto.
Não quer dizer, nesse estágio, que o enlutado “superou” o luto e tudo voltou a ser como era antes: talvez as coisas nunca mais sejam exatamente como eram, e isso não é um problema. Na aceitação, a pessoa se permite refletir e perceber melhor a situação em que se encontra, fazer alguns planos e criar algumas expectativas. As dificuldades e limitações não desaparecem, mas a pessoa consegue permitir que a vida continue, adaptando-se como consegue ao novo cenário.
Nesse estágio, o enlutado enxerga que o que aconteceu não vai desaparecer de forma mágica e ele precisará seguir em frente.
Embora seja um período de profunda dor, quando vivemos o luto, devemos buscar o fortalecimento da fé e a confiança nos desígnios de Deus, mesmo que o sofrimento pareça paralisar. Aquele que tudo pode e tudo vê ampara e tem o poder de transformar essa dor.
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