Padre Wilson Czaia tem 53 anos e é natural de Curitiba (Paraná). Até os 4 anos de idade, viveu como toda criança, brincando e se alimentando normalmente ao lado de seus pais (Eduardo e Maria de Lourdes Czaia) e irmão (Carlos José Czaia).
“A partir dessa idade, meus pais começaram a notar que eu era mais agitado do que as outras crianças e também perceberam que quando me chamavam eu não respondia. Preocupados, levaram-me ao médico e suas desconfianças foram confirmadas, eu era surdo”, contou.
Preocupados com o futuro do filho, os pais pediram ajuda a profissionais da saúde, que orientaram a matrícula na Escola de Educação Especial Epheta, sob a direção da Irmã Letícia.
Durante todo o processo de compreensão da surdez e do aprendizado, a escola teve papel fundamental. No espaço, conseguiu desenvolver a comunicação oral, emitindo sons e construindo frases, bem como conhecendo o sentido das palavras.
Padre Wilson conta também que foi nessa escola que conseguiu construir sua vida, tendo mais facilidade na socialização e adequação na surdez.
Para além dos aprendizados do dia a dia e educacionais, a fé também se fazia presente no ambiente escolar. No local, participou de grupos de jovens e encontros.
“Os seminaristas Palotinos, começaram a organizar encontros com casais surdos, e eu comecei a participar das palestras, que me ajudaram muito a conhecer a Igreja. Com isso, um grupo de casais e jovens surdos, começaram a se reunir semanalmente, para aprofundar a fé. A maioria era ex-aluno da Escola Epheta, e por isso tinham algo em comum. Assim, tive minha infância e juventude sempre amparado pela vida de oração, pela catequese e pelos valores cristãos”, comentou.
Padre Wilson Czaia faz o sinal de Eu te Amo em Libras
Como participava ativamente dos grupos de jovens e casais surdos, Wilson acompanhou de perto a busca e o apoio da Igreja Católica para sua comunidade. Com ajuda de um seminarista que aprendia Libras, o grupo se fortalecia e aprendia cada vez mais sobre as palavras de Deus.
O seminarista era o Padre Ricardo, fundador da Pastoral dos Surdos de Curitiba. Foi ele que em 1999 celebrou a primeira missa celebrada na Língua Brasileira de Sinais.
“Padre Ricardo fundou a Pastoral dos Surdos em Curitiba e eu pude acompanhá-lo juntamente com a coordenadora surda Elizanete Fávaro, nas missões em Paranaguá. Então tudo tomou uma proporção vocacional para mim”.
Esse pontapé inicial ao lado de pessoas tão representativas e crentes em Deus proporcionou a Wilson conhecer realidades que não imaginava. “Vi a triste realidade de surdos sem família, sem estudo, sem recursos, fazendo a primeira comunhão. Foi nesse dia que senti que Deus me chamava para um trabalho mais profundo, com os surdos”.
O chamado de Deus foi enorme e, em 1999, Wilson começou seu processo de discernimento vocacional.
Muitas pessoas auxiliaram Wilson nos seus estudos sacerdotais. Primeiro, em 2001, o mesmo Padre Ricardo o auxiliou no curso de Filosofia da Faculdade Arquidiocesana de Filosofia. Depois, em 2002, quando iniciou seus estudos de Teologia, contou com apoio de colegas que dominavam Libras.
“Durante o processo de formação, passei por muitas dificuldades por causa da surdez, mas em nenhum momento os formadores me abandonaram, pelo contrário, sempre me apoiaram e me animaram para continuar o discernimento”.
Foi em 2006 que Wilson foi ordenado Diácono da Paróquia Nossa Senhora da Anunciação. Enquanto terminava os estudos de teologia, pode fazer sua prova De Universa (que é oral e com a presença de um representante de Roma). No mesmo ano, com a presença de surdos do Brasil todo, foi ordenado sacerdote na Igreja São Francisco de Paula.
Sabendo que mais pessoas surdas tinham dificuldade de participar da vida da Igreja, Padre Wilson foi designado para cuidar da Paróquia Nossa Senhora da Ternura para pessoas com deficiência. “Hoje, tenho a oportunidade de crescer cada dia mais como pessoa, superando as barreiras físicas e trabalhando com surdos e ouvintes”.
15 anos depois dessa designação, Padre Wilson se orgulha de auxiliar na Pastoral dos Surdos. Hoje, explica que com as tecnologias há mais facilidade na comunicação, mas que a surdez ainda é um obstáculo para muitos. Por isso mesmo, segundo ele:
“A Pastoral dos Surdos tem essa missão: inserir os surdos na vida da Igreja, no conhecimento e na experiência de Jesus Cristo e de levar o Evangelho para todos os surdos que ainda não conhecem”, explica.
Padre Wilson Czaia faz o sinal de Eu te Amo em Libras, com Nossa Senhora Aparecida
A inclusão das pessoas com deficiência na Igreja e na comunidade é muito necessária. E ela passa, de acordo com o Padre Wilson, pela acolhida e respeito. Até porque, surdos, cegos, deficientes físicos, etc., estão em todos os lugares, inclusive na Igreja.
“Precisamos acolher todos para as missas, catequese, sacramentos, cursos, encontros, retiros, e todas as atividades. Para isso é muito importante que as comunidades invistam em surdos para assumir seu protagonismo e também ouvintes que sejam capazes de interpretar e integrar os surdos nas comunidades”.
Outro ponto importante é aprender a comunicação com pessoas surdas, e aí ele dá uma dica valiosa: aprender Libras. A língua de sinais é a maneira pela qual os surdos conseguem comunicar-se.
“Essa é a nossa língua e a maneira pela qual sentimos e ouvimos: pelos olhos e pelas mãos, nos comunicamos com Deus e com os irmãos“, finaliza.
Além da Pastoral que Padre Wilson atua, em Curitiba, há várias outras pastorais como ela no Brasil. A CNBB disponibiliza uma lista para que você encontre a mais próxima.
O objetivo de todas as pastorais dos surdos é receber surdos e surdas para conduzir ao caminho de Cristo, Verdade e Vida, relembrando o milagre do “effata”, exposto no Evangelho de Marcos 7, 32-35:
“Trouxeram-lhe um surdo pedindo que lhe impusesse as mãos. Levando-o a parte, longe da multidão, colocou-lhe os dedos nos ouvidos, cuspiu e lhe tocou a língua com saliva. Levantou os olhos para o céu, suspirou e disse – Effata, que quer dizer: Abre-te. Imediatamente os ouvidos dele se abriram, soltou-lhe a língua e ele começou a falar perfeitamente”.
Além disso, a Igreja compreende a necessidade de também alcançar as pessoas surdas, de modo a convidá-las a aprofundar sua espiritualidade e compreender as mensagens de Deus. Inclusive, sendo evangelizadoras, como é o caso do Padre Wilson.
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