“Todas as coisas são mistérios/ Por que tanta dor pela rua/ Por que tanta morte no ar/ Por que os homens promovem a guerra/ Em nome da paz?”. O questionamento poético do cantor Zé Vicente, na canção Mistérios, fala sobre aquilo que escapa à lógica imediata. A música conversa, de forma simples, com o que a Tradição cristã declara há séculos: há sentidos da vida e da fé que podem não se explicar totalmente, mas se revelam aos poucos, no encontro com Deus. A isso a Igreja chama de “mistério da fé”.
A expressão, proclamada especialmente durante a celebração da Eucaristia — “Eis o mistério da fé” —, significa um segredo ou algo que não deve ser descoberto? Zélia Pedrosa, membro do Centro de Estudos Bíblicos (CEBI), explica o conceito:
“Na dimensão da fé, o mistério é outro. É descobrir o sentido profundo da realidade. Os sinais, os gestos, as palavras e as realidades visíveis não se esgotam em si, mas apontam para o transcendente”, explica.
Enquanto no uso comum a palavra mistério pode remeter a algo oculto ou reservado a poucos, para a fé tem outro peso. Zélia explica que, quando a Igreja quer se referir a algo que deve permanecer em silêncio ou não pode ser divulgado, ela usa outras palavras, como segredo ou sigilo — por exemplo, o segredo de confissão ou o sigilo do conclave.
O mistério, por sua vez, “diz respeito à nossa relação com o divino e à resposta do fiel. É mistério da fé porque se trata de um diálogo que só faz sentido para quem crê e busca encontrar na revelação o rumo para entender a vida e a sua missão”, completa. Ou seja, é uma realidade que se torna acessível não por esforço intelectual, mas por abertura do coração e da vida à ação de Deus.
A expressão mistério da fé é proclamada no momento central da Missa, logo após a consagração do pão e do vinho. É um mistério porque, como diz Zélia, “Jesus escolheu permanecer em sua comunidade em um simples pedaço de pão, alimento corriqueiro para o corpo e alimento necessário para a alma”.
A fé não é um conjunto de respostas prontas, é uma adesão confiante ao que Deus revelou, mesmo que nossa razão não consiga compreender totalmente. O mistério não é escuridão, é profundidade. Não é ausência de sentido, mas sentido que ultrapassa.
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