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Você saberia o que fazer se um colega de trabalho tivesse uma crise de ansiedade bem ao seu lado? Situações assim ainda são cercadas de incertezas e, muitas vezes, silêncio. Enquanto boa parte das empresas já tem protocolos bem definidos para acidentes físicos, os chamados “primeiros-socorros emocionais ou psicológicos” ainda são um desafio no ambiente corporativo.
Porém, mudar esse cenário é urgente, inclusive devido às novas exigências legais para o cuidado com a saúde mental nas empresas. A partir de 26 de maio de 2025, todas as empresas brasileiras deverão incluir a avaliação de riscos psicossociais no processo de gestão de Segurança e Saúde no Trabalho (SST). A exigência é fruto da atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), promovida pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em agosto de 2024. A mudança reconhece que o sofrimento emocional também representa risco à saúde e à produtividade — e que precisa ser acolhido de forma adequada.
Para entender melhor como empresas e profissionais podem se preparar para lidar com essas situações, o portal IDe+ conversou com a psicóloga Graciela Mendes de Castro, que atua na Unimed Curitiba, é mestre em Psicologia Clínica e da Saúde, especialista em terapia cognitivo-comportamental, inteligência emocional e psiconutrição. Com 18 anos de experiência na área clínica e organizacional, ela traz orientações sobre como aplicar os chamados primeiros-socorros psicológicos no ambiente corporativo.
IDe+ | Muitos espaços já estão mais habituados e preparados para lidar com os primeiros-socorros relacionados às questões físicas. Quando falamos de saúde mental, como você avalia esse cenário?
Hoje temos avanços importantes na discussão sobre saúde mental, mas ainda estamos construindo esse caminho dentro das organizações. Enquanto os protocolos para primeiros-socorros físicos já são bem definidos e amplamente aplicados, quando o assunto é sofrimento psíquico, muitas pessoas não sabem como agir, existe um receio de “fazer errado”.
IDe+ | Como as empresas devem se preparar para lidar com as questões de saúde mental das suas equipes?
O primeiro passo é entender que saúde mental não é um tema à parte — ela deve fazer parte da estratégia da empresa. Isso significa investir em ações preventivas, como treinamentos, rodas de conversa, programas de apoio psicológico e capacitação dos gestores focando na liderança humanizada e emocional. Os líderes precisam estar preparados para identificar sinais de alerta, acolher com empatia e saber como encaminhar os casos. E, principalmente, é necessário criar um ambiente onde os colaboradores se sintam seguros para falar sobre o que estão vivendo, sem medo de julgamentos.
IDe+ | E os colegas, como podem reconhecer e colaborar com o próximo?
O olhar atento e empático dos colegas de trabalho — de quem está próximo, convivendo — é fundamental. Muitas vezes, são eles que percebem os primeiros sinais de sofrimento: uma mudança repentina no comportamento, afastamento do grupo, irritabilidade ou queda no desempenho. A melhor forma de ajudar é escutar com respeito: “escuta ativa” e “olhos nos olhos”, sem julgamentos ou pressa para dar conselhos. Frases como “estou aqui se quiser conversar” ou “posso te acompanhar até o setor de apoio” são mais úteis do que tentar resolver o problema. O cuidado entre colegas cria uma rede de apoio poderosa.

Psicóloga Graciela Mendes de Castro./Foto: reprodução Instagram @gpsi.gracieladecastro
IDe+ | De forma mais prática, quais são as dicas para os primeiros-socorros relacionados à saúde mental? O recomendado é chamar um profissional? E enquanto isso?
Sim, em casos de crise emocional intensa, o ideal é acionar os canais de apoio psicológico ou um profissional qualificado, como psicólogo ou psiquiatra. Também é possível encaminhar a pessoa para o serviço de saúde mais próximo. Não deixe a pessoa desamparada ou sozinha, até que esteja em segurança. Enquanto isso não acontece, há algumas atitudes que fazem muita diferença:
- Mantenha a calma e conduza a pessoa para um local mais tranquilo.
- Pratique a escuta ativa: ouça com atenção, sem interromper, julgar ou minimizar.
- Evite frases como “isso vai passar” ou “não pense assim”. Prefira algo como “você quer me contar o que está acontecendo?”
- Ofereça apoio e incentive a buscar ajuda profissional.
Essas atitudes simples podem aliviar o sofrimento imediato e mostrar que a pessoa não está sozinha.
IDe+ | Quais são as outras dicas de prevenção — para estabelecer e manter um ambiente saudável de trabalho?
A prevenção exige compromisso contínuo da empresa e das lideranças. Algumas ações eficazes incluem:
- Incentivar pausas e o equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
- Promover a escuta ativa e o respeito entre colegas.
- Oferecer espaços de acolhimento e diálogo, como rodas de conversa ou programas de saúde emocional.
- Valorizar a transparência na comunicação interna e o reconhecimento do esforço da equipe.
- Capacitar líderes para atuarem com empatia e mais sensibilidade.
Ambientes saudáveis são construídos com cuidado diário. E quando a empresa prioriza a saúde mental, colhe benefícios em todos os níveis: mais engajamento, produtividade e, acima de tudo, pessoas mais saudáveis e bem cuidadas.