Infelizmente, quando uma pessoa morre, a maioria dos herdeiros briga no momento da partilha de bens. Entretanto, o legado moral de um indivíduo é mais importante do que qualquer bem material.
É incontestável que os direitos relacionados à dignidade da essência de uma pessoa (e não ao seu patrimônio) são os maiores direitos que existem hoje. No meu artigo, em vez de abordar o tema da herança, falarei sobre os temas do direito que protegem a memória das pessoas falecidas.
Para entender a importância do respeito à integridade da pessoa mesmo após sua morte, é preciso refletir sobre o conceito dos direitos que cuidam da dignidade e da honra de cada indivíduo.
Os direitos da personalidade abrangem o corpo humano, a identidade, a privacidade, a liberdade e o respeito individual. Eles estão estruturados no Código Civil (do artigo 11 ao artigo 21) e são chamados de “direitos personalíssimos” também. Esses direitos buscam proteger a integridade da pessoa, porque defendem os atributos existenciais do ser humano. As principais espécies de integridade são: a física, a psicológica e a moral.
No Código Civil, uma verdade óbvia é declarada: a morte representa o término da pessoa natural no âmbito jurídico. Logo, ela representa o fim da possibilidade de invocar mecanismos de proteção para os nossos direitos da personalidade.
A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva (artigo sexto do Código Civil).
Todavia, é evidente que o peso jurídico da integridade de uma pessoa ultrapassa a sua vida e que os direitos mais importantes devem ser respeitados mesmo após a morte dela.
Os direitos da personalidade são intransferíveis. Contudo, existe a proteção post mortem (posterior à morte) de alguns desses direitos. O direito à imagem e o direito à honra são os exemplos mais comuns dos valores jurídicos que merecem consideração tanto na vida quanto na morte.
O cônjuge e os familiares da pessoa falecida possuem a legitimidade para defender alguns dos seus direitos de forma excepcional (de acordo com o parágrafo único do artigo 12 e com o parágrafo único do artigo 20 do Código Civil). É importante ressaltar que a família pode pleitear em prol da memória de alguém no âmbito judicial.
Excepcionalmente, existe a defesa post mortem de alguns direitos da personalidade previstos na lei: direito ao nome, direito à proteção dos fatos da vida privada, direito à honra e direito à dignidade da memória.
Podemos dizer que a honra, a boa fama e a respeitabilidade de um indivíduo precisam ser resguardadas após a morte. A divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais (de acordo com o artigo 20 do Código Civil).
São partes legítimas para requerer a proteção da honradez da pessoa falecida: o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes (conforme o parágrafo único do artigo 20 do Código Civil).
É importante salientar que os herdeiros também podem ser atingidos tanto no âmbito moral quanto na esfera econômica quando as pessoas desrespeitam a dignidade de um familiar falecido através da divulgação de fatos da sua vida privada ou da exposição de imagens. Por essa razão, eles têm legitimidade para defender a memória do familiar.
Inventar que alguém cometeu um crime e espalhar esta mentira publicamente são as atitudes que configuram o crime de calúnia (artigo 138 do Código Penal). Se, depois que a pessoa morre, alguém inventa que ela cometeu um crime durante a vida, essa mentira poderá gerar punições no âmbito jurídico.
Para proteger a memória do falecido e os interesses dos familiares que buscam resguardar a dignidade de uma pessoa que não pode mais se defender, o Código Penal declara que é punível a calúnia contra os mortos (parágrafo segundo do artigo 138 do Código Penal).
A ofensa é feita à memória do morto, não à pessoa dele, já que os familiares representam as vítimas desse caso. Geralmente, a família sofre o reflexo da ofensa através da discriminação e do preconceito da sociedade. Desse modo, a queixa pode ser movida pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão do indivíduo falecido.
Calúnia
Art. 138 – Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
1º – Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.
2º – É punível a calúnia contra os mortos.
O vilipêndio de cadáver é um crime previsto no Código Penal (artigo 212) que consiste em desrespeitar a dignidade do corpo de uma pessoa morta. As principais atitudes que configuram esse crime são: esmurrar o corpo, cortar algum membro, rasgar as vestes ou dispersar as cinzas com desrespeito.
Atualmente, com o avanço da tecnologia, esse crime está acontecendo de maneira virtual também. É importante ressaltar que o compartilhamento das imagens dos corpos na internet pode ser considerado crime. Perceber a intenção da pessoa durante a divulgação das imagens é crucial para o julgamento dela, porque é necessário comprovar a intenção de desrespeito.
Infelizmente, quando uma pessoa famosa sofre um acidente, muitas imagens são divulgadas na internet de maneira criminosa. É preciso saber que as pessoas falecidas (anônimas e famosas) deixam familiares e amigos que guardam sentimentos de boa memória e admiração. Portanto, o respeito sempre será um valor universal e imortal.
O crime de vilipêndio de cadáver
Art. 212 – Vilipendiar cadáver ou suas cinzas:
Pena – detenção, de um a três anos, e multa.
Observação: a pessoa que faleceu não pode ser a vítima propriamente dita de um crime, porque não tem mais a capacidade de sentir a ofensa. Sendo assim, o bem jurídico lesado é o sentimento de respeito que se guarda em relação ao falecido. Consideramos que as pessoas enlutadas e aquelas que guardam a boa lembrança e o sentimento de veneração são as vítimas dos “ataques” dirigidos contra os mortos, porque elas sentem a ofensa. Logo, o Direito permite que elas defendam a memória de alguém perante a Justiça.
Fontes bibliográficas:
Fontes legislativas:
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